terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

A nova morte de Deus

A morte de Deus já foi preconizada por Nietzsche e até por muitos teólogos. Infelizmente, muitos que deviam viver em comunhão com o Senhor continuam matando-o. Há igrejas e crentes formalistas, que se dedicam ao lado institucional e organizacional do cristianismo em que o que vale é o trabalho da igreja. Uma pessoa se converte e logo é adestrada para se envolver intensamente com as atividades da congregação, transformando a igreja num fim em si mesma. Ali, trabalha-se tanto para a obra de Deus que se esqueceu do Deus da obra – ou seja, mataram o Senhor e, em seu lugar, foram colocados eventos e muita ação dos membros. É o evangelho pragmático e institucionalizado de muitas igrejas históricas.

Há também igrejas que reagiram a esse ativismo mecanicista em busca de uma experiência espiritual, segregando as outras co-irmãs – a quem chamam de ativistas –, como se não tivessem o Espírito Santo. A busca do “poder” acaba satisfazendo a vida mais emocionante, valorizando mais a experiência carismática do que o próprio Deus que, afinal das contas, é quem a concede. No vácuo causado pela morte de Deus, criaram outro, que pudesse lhes dar poder de fazer milagres e curar com hora marcada. Neste caso, enquadram-se muitas igrejas pentecostais e carismáticas.


Há também aqueles que hoje são fortes em oferecer um Evangelho que mais parece mercadoria, disponibilizando bens simbólicos da religião para satisfazer as pessoas em seu projeto de vida boa. Mataram Deus, transformando-o em servo, em mercadoria barata, oferecida em troco de uma boa oferta, também chamada sacrifício. Temos aqui as igrejas neopentecostais.


Ultimamente, tem surgido um outro movimento que provisoriamente tenho chamado de “adoracionismo”, que segue de perto o profetismo místico descrito por Max Weber. São aqueles crentes que curtem um “transe” de meditação gospel – gostam de viver no “monte da transfiguração”, vivem da contemplação no meio de louvores que elevam sua alma ao sétimo céu, mas se desligam do cristianismo de uma vida real, comprometida com os valores éticos bíblicos. Vivem adorando a Deus, mas na realidade podem tê-lo matado para dar vazão ao seu próprio sentimento de bem estar interior. É como se fosse uma ioga evangélica, uma catarse de fim de semana.


Mas Deus é vivo e real. Ele é Deus, soberano; devemos tê-lo como nosso Rei, reconhecendo nossa limitação, nossa finitude, nossa corrupção. Devemos nos render aos seus pés e viver para alegrá-lo, agindo com cristãos neste mundo que precisa de exemplos concretos de uma vida com significado além do mero antropocentrismo que deseja reduzir Deus ao tamanho de nossos desejos ou angústias. Cristianismo fora disso significa mesmo a morte de Deus.

Lourenço Stelio Regaé teólogo, educador e escritor.