terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Já não se fazem pastores como antigamente

Depois de 30 anos de ministério trabalhando em igrejas locais e numa grande denominação brasileira, mais 32 anos no exercício do magistério teológico, tenho refletido sobre o que dizem membros e líderes de muitas igrejas a respeito da atuação pastoral. E fico cada vez mais perplexo com o que presencio. Hoje, muitas ovelhas procuram ficar distantes de seu pastor por acreditarem que, ao se aproximarem do ministro, vão ouvir algum sermão ou receber uma tarefa. Aí, concluem que pastor só serve para dar bronca ou se aproveitar de mão de obra útil e barata disponível nas igrejas – e ainda pagam a conta no fim do mês, dando o seu dízimo.

Outras ovelhas demonstram estar cansadas de ver o narcisismo de seu pastor que, sempre cheio de si, faz elogiosas menções ao seu próprio nome sem qualquer vermelhidão na face. Mas há ainda casos em que o pastor, em vez de pastorear, cuidar do rebanho, acaba como que um verdadeiro gerente da congregação. Ele agenda eventos, determina prioridades e supervisiona todas as atividades do rebanho, como um verdadeiro executivo dos púlpitos. O controle é tão grande, e muitas vezes exercido com mão de ferro, que o que chamam “obra de Deus” passa a ser mais importante que o próprio Deus. Para estes, o cristianismo deixou de ser vida, para ser apenas trabalho maçante.


É possível também observar que muitos acabam agindo como despachantes do Senhor. Há pastores e líderes que acreditam piamente que apenas a sua oração é que tem acesso livre e desimpedido a Deus. Assim, tendem a transformar suas ovelhas em servos do ministério, em vez de levá-las a depender de Deus. E o que dizer dos pastores “showmen”, que tranformam o culto em espetáculo? Para estes, minúcias como a data de aniversário ou o problema familiar de um determinado fiel passam em brancas nuvens. Só se lembram da ovelha quando a vêem no culto.


Todavia, ser pastor é muito, muito mais do que isso. Pastorear é ter sede pela convivência; é cultivar relacionamentos; é interessar-se por saber como está cada ovelha – quais são seus dilemas, suas ansiedades, suas angústias e até mesmo suas falhas, para poder ajudá-la no aperfeiçoamento de vida. Ser pastor é acordar de madrugada para orar pelos membros da congregação, por suas famílias. Ser pastor é depender de Deus para conseguir levar a sobrecarga do ministério, é partilhar suas atividades com um grupo de discipuladores.


É, já não se fazem pastores como antigamente...

Lourenço Stelio Regaé teologo, educador e escritor.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Não quero ser o menor!

Ontem decidi não obedecer minha agenda. Por conta disso, fiquei em casa com minha mulher e as crianças. Fiz de tudo um pouco. Dei expediente pastoral e paterno ao mesmo tempo, pois é aqui que percebo a energia do texto em que Deus é simbolizado por uma galinha, quando disse: “Debaixo das minhas asas estareis seguros”. Meus filhos se alegraram com a segurança oferecida. E, é claro, também tive tempo para deixar um pouco de lado o obreiro, o pai, o profissional, para ser somente o marido-amigo.Depois que foram todos dormir, permaneci por mais um tempo na sala. Vivi aqueles momentos em que nossa mente está liberada para o inusitado, o novo. Deitado no divã da minha própria consciência, me surepreendi pensando naquele momento em que Jesus declarou para seus discípulos: “Quem quiser ser o maior, seja o menor de todos” (Mateus 20.26).

Pode até parecer loucura, mas após um bom período de reflexão cheguei à conclusão de que não quero ser o menor. Tenho visto no meio evangélico um grupo muito grande de pessoas que, por conta da necessidade de serem “o menor”, deixaram de sonhar com grandes projetos, de desejar melhores condições de vida e até mesmo de se preparar para assumir posições mais altas e de maior responsabilidade, seja na igreja ou na sociedade de um modo geral. Para muitos cristãos, ser “o menor” acabou se tornado um enclausuramento, um estilo de vida quase essênico. Afastaram-se de tudo e de todos, sem se dar conta de que estamos num mundo em constantes e profundas mudanças, e que exige o mesmo de nós.


No afã de ser esse “menor”, muitos se afastaram e outros criaram uma visão negativa em torno da busca do saber e da cultura. Afinal, dizem eles, “a letra mata”. Em relação ao mercado de trabalho, por exemplo, temos muitos servos de Deus frustrados, e outro desempregados – infelizmente, nem sempre por falta de vagas, e sim, de capacitação profissional. De certa maneira, no meio evangélico, isso é gerado pelo misticismo em torno da tal busca, sem fundamento bíblico, por ser “o menor”. Não! Definitivamente não quero ser esse menor. Quero ter o direito de desejar o melhor para minha vida, para minha família e também para o meu ministério. Espero ter a oportunidade de um aperfeiçoamento teológico e lingüístico em outro país, desenvolver uma visão cultural e espiritualmente relevante sobre a engrenagem que rege a vida humana. Um mestrado e doutorado, quem sabe.A percepção exata do que somos e do que podemos ser é o que realmente configura o foco da mensagem de Cristo naquele dia aos discípulos da Galiléia. Fomos chamados para servir alguma coisa a alguém. Esse é o chamado de Cristo. Fomos convocados para oferecer algo e não para vivermos no redemoinho da mediocridade. Deus sempre desejou o melhor para o homem, e por isso, não creio que Jesus estivesse convidando os discípulos a viver a “teologia da hiena”, tão bem expressa num desenho animado de minha infância, no qual o personagem repetia constantemente: “Oh, vida! Oh, céu! Oh, azar!” Esse parece ser o lema daqueles que buscam ser o “menor”, fora da interpretação correta das palavras do Mestre.


A proposta de Jesus era diferente desse evangelho oco, vazio e revestido de falsos sentimentos de humildade. Ser o menor, então, não é ver as coisas dando errado ou viver andando para trás. É na verdade o oposto disso. Ser o menor é dar-se a si mesmo em favor dos outros. Ser o menor é construir possibilidades de vida coletiva e não de afundamento social; é dar ao outro o que se tem alcançado no ser, e não privar-se de ser o que o outro, por situações adversas, não é.


Ser o menor é chegar o mais alto que conseguir, o mais longe que puder, sem contudo esquecer que, quando necessário, devemos descer e dar a mão ao que ficou embaixo, voltar atrás e levantar aquele que, por algum motivo, tenha caído, ou como disse o próprio Mestre: “Quem quiser ser servido, que sirva a todos”.


Quero ser o menor ao estilo apóstolo Paulo que, mesmo diante dos desafios, soube ser grande e ser servo. Quero ser o menor sob a perspectiva paulina, onde o ontem que foi ruim só será proveitoso mediante os acertos promovidos hoje, tornando possíveis as realizações propostas para o amanhã. O desafio não é ficar por baixo remoendo os erros e os fracassos, e sim, tirar lições proveitosas deles. Dar a volta por cima, como se diz. Ou como diria o próprio Paulo: “Esquecendo-me das coisas que para trás ficam, prossigo para o alvo da soberana vocação”.


Ser o menor, em última análise, consiste então em saber que devemos servir a todos indiscriminadamente. Isso equivale a ter o que oferecer e a quem oferecer, pois, do contrário, será impossível ser o menor sem ter a quem – ou ao quê – servir.


Roberto Santos é bacharel em teologia e pastor aspirante na Igreja Metodista Wesleyana .